Não
consigo me lembrar como isso começou. Tudo que sei é que tenho que
ligá-las. Todas elas. As luzes. Algo está na escuridão.
Eu tenho
um vislumbre, às vezes. Quando se aproxima. Quando as luzes piscam.
Consigo ouvir a respiração, também. O que quer que seja, não é
uma coleção de partes de corpos mal se agarrando à vida, como em
um pesadelo. Soa como algo forte, como um caçador aguardando seu
momento. Deve haver algo de errado com a fiação elétrica na casa.
As luzes não ficam acessas depois que eu deixo a sala, e as que
ficam estão fracas, ou piscando. Principalmente as fluorescentes.
Ah, como eu queria que nós não as tivéssemos.
Então
aqui estou eu, correndo de sala em sala, desesperadamente apertando
os interruptores que eu apertara apenas alguns minutos antes.
Desesperado para continuar na luz, mas tenho que continuar me
movendo. Se eu estiver no local quando as luzes piscarem, irá se
aproximar.
Há
outros aqui, tenho certeza disso. Estão fazendo o mesmo que eu -
acendendo as luzes o mais rápido que podem. Mas nunca esbarro neles,
embora consiga ouvi-los, e eu os chamo. Acho que estamos começando a
nos coordenar. Mais luzes estão acesas agora. Não todas, mas muito
mais.
Estive
fazendo isso por tanto tempo. Quando tempo alguém pode permanecer em
um estado de pânico? Por quanto tempo alguém é capaz de correr
pelos mesmos quartos, de novo e de novo? Até quando alguém é capaz
de ficar encarando uma lâmpada e rezar para um deus em que nem mesmo
acredita, para que a luz aguente só mais um pouco?
Eu venho
fazendo isso há tanto tempo que o mundano, retido por adrenalina e
suor, começa a reafirmar-se. Eu quase rio - Mas realmente preciso
urinar.
Está
próximo. A luz está acesa nesse quarto, mas a sala ao lado treme
com a luz instável de um tubo fluorescente. Acho que é a cozinha -
Não consigo me lembrar. Consigo senti-lo aqui, esperando perto da
porta. Esperando que a luz dessa sala pisque também. Mas eu sei que
está perdendo. Mais e mais luzes estão acesas. Tenho certeza que vi
um dos outros saírem assim que entrei nessa sala. Estamos ganhando.
Vamos ficar bem. Só preciso manter esta luz acesa. Mantê-la
estável. Só preciso...
A luz na
sala ao lado, de repente, para de piscar. Está acesa. Forte.
Estável. Estão todas acesas, todas as luzes acesas. Aquilo não
pode mais estar aqui. Ganhamos, estou seguro. Ainda não consigo ver
ninguém, mas já não importa mais. Passou. E eu ainda preciso fazer
xixi.
Vou até
o banheiro. Luz forte e estável. Nossa conta de luz vai vir mais
alta que o normal, mas tudo bem. Eu fecho a porta, abaixo minha
calça. Devo ter corrido por horas - preciso tanto desse momento!
Sem nem
mesmo pensar, pela força do hábito, minha mão estúpida me trai e
vai até o interruptor para ligar a luz. Mas ela já está acesa e
tudo que eu consigo fazer é desligá-la. Uma respiração quente no
meu pescoço. Ao menos eu não preciso mais usar o banheiro.
(Tradução e adaptação: Elaine Oliveira | Texto de: Maldream)